O causo de 15 de Fevereiro

16 de fevereiro de 2023

O dia é 15 de fevereiro. Um dia chuvoso, meio gelado, dia de sair de calça jeans e blusa de flanela no meio do verão. Um ótimo dia.

A cada 15 dias nas quintas feiras a Meruru faz um campeonato de GLC, um formato alternativo de Pokémon que usa umas cartas mais antigas. Eu sempre quis ir nesses torneios, mas quinta é um dia ruim: rodizio do carro. Tenho que ir e voltar de metrô. Que é ok, mas eu já me acostumei com a vida boa de voltar rapidinho no confronto do meu Argo. Enfim.

Decidi ficar a tarde toda nesse 15 de fevereiro montando uma lista meio maluca. Um deck desse formato roda uns 10-13 Pokémons. O meu roda 6. Me faltaram duas cartas, então teria que passar na Domain antes do torneio.

Deste ponto em diante, até eu dizer o contrário, eu estou usando meu headphone bluetooth barato da Phillips (ou da Sony?). Gosto de ficar ouvindo música e não ouvir as conversas alheias do metrô (nesse momento o tópico à minha direita é "os viados padrão da Cassio).

7 minutos de caminhada com uma leve garoa até a estação Vila das Belezas. Dai são uns 40 minutos de metrô na linha lilás, uma baldeação relativamente longa na Santa Cruz, e 1 singular estação até a Vila Mariana. Mais uns 5 minutos andando e chego na Domain.

Não fico nem 5 minutos lá. Pego uma Pokedoll e um Archen pro meu brew de GLC de luta. Devo ter tirado meus fones por 1 ou 2 minutos, para pagar os 5 reais das minhas cartas. Daí devo ter passado alguns minutos no ponto de ônibus, no máximo uns 15. Entro no Dom Pedro II e vou em direção à estação São Joaquim.

Do mesmo jeito que não estava seco nem molhado, ou nem frio nem quente, o ônibus não estava cheio nem vazio. Até dei sorte de sentar logo que entrei. Não sei quanto tempo até a estação. Desci lá (tive que gritar VAI DESCEEEEER) e fui para o Sukiya local. Foi reformado recentemente, é bem bonitinho.

Apenas 3 funcionárias trabalhavam lá: uma ficava exclusivamente na cozinha, as outras duas corriam para fazer pedidos, arrumar cadeiras, e manusear o caixa. Demorou um pouco, tanto para eu ser atendido, quanto para meu chiken katsu chegar. Não culpo as funcionárias. Não tirei meu fone em nenhum momento dentro do restaurante.

Ao sair, passei numa bomboniere ao lado, comprando um Talento caro de chocolate meio amargo com "nibs de cacau". Estava apenas ok. Comi uns 2/3 do chocolate e estufei o resto no meu bolso esquerdo, junto de minha carteira e minhas chaves. Lembre-se disso.

A caminhada até a loja é uma leve descida. Minha temperatura corporal é um misto de quente demais pra colocar minha camisa, mas levemente gelado. Já ouvi minha playlist "triângulo de verão" inteira, um apanhado de j-rock (shoegaze ou não), depois troquei para uma mais leve, "dipiroca", obrigado Bruno pelo ótimo nome. Músicas eletrônicas mais novas (e meio underground?).

Não demorou até eu estar dentro da loja. Após uma rápida sondada, meu único conhecido é o Dudão, mais o funcionário/juiz do dia, que comprou meu boné do LAIC 2024 por... 120 reais eu acho? Nunca descobri o nome do rapaz. Deste momento em diante estou com meu fone em meus ombros/pescoço.

Me inscrevi no torneio. Esperei um pouco até meu amigo Diogo chegar. Conversamos e fizemos uma partida de teste. As oito horas da noite chegaram.

Durante as 3 rodadas de GLC, onde eu fiz um suado e complicado 3-0 contra decks de Grama, Psíquico e Grama, meu fone de ouvido ficou na mesma posição. Não coloquei ele sob meus ouvidos, não o deixei na mesa. Ele passou 3 rodadas de 50 minutos colado no meu corpo. Acho que o fone está no meu corpo desde que eu saí de casa, ou na minha cabeça ou no meu ombro. Eu não o tirei em nenhum momento.

A terceira rodada foi a mais fácil. Depois de T2 chan, T3 lee, T4 top (e a necessidade de uma moeda de Cramorizador pra pegar uma energia), T5 Archeops + Devoluter, o jogo simplesmente acabou. O deck de evolução do meu oponente estava sem evoluções no campo, e não podia mais evoluir. Depois desse jogo, começamos a conversar e jogar uma partida casual. Até usei outro baralho. Os dois jogadores à minha direita também terminaram o seu jogo, e se juntaram à conversa.

Em certo momento, no meio da terceira rodada, devia ser entre 21h30 e 22h, o cara da minha direita puxa o meu fone de ouvido e tira do meu pescoço. Eu fico meio confuso. Nem conheço o indivíduo. Ele joga o fone na mesa. O fone está cheio de formigas. Formigas marrons e muito, muito pequenas.

Os quatro olham para o fone, meio desconcertados. Um cara dá risada de nervoso. Eu não acredito no que estou vendo. Instintivamente passo a mão nos meus ombros e no meu pescoço. Nada. Na região do peito. Nada.

Não tem muitas formigas no fone... mas tem mais formigas do que devia ter num fone de ouvido. Tipo umas 5-10 correndo por aí. Passo a mão e limpo todas elas. Mais aparecem, e 2-3 constantemente estão correndo pelo fone de ouvido.

Daí em diante minha noite foi dominada pela paranoia. Que porra é essa? Como isso aconteceu? Tento continuar jogando e conversando, mas as formigas não saem da minha cabeça. Passo a mão no cabelo, nas orelhas. Nada. Não tem uma singular formiga em minha pessoa.

Em algum momento percebo que elas estão começando a se espalhar pela mesa. Não muitas, de novo, menos de 5 daqui em diante. Eu jogo o fone em outra mesa. O Diogo termina o jogo dele. Digo sobre o meu 3-0 (mais importante) depois sobre as formigas (menos importante).

Em dado momento da conversa me toco. Tem um chocolate no meu bolso. Essas são as típicas formiguinhas de doce, não são muito grandes, devem ter atacado meu bolso... de algum lugar, algum jeito. Eu tiro o chocolate do meu bolso, enrolado na própria embalagem. Não há nenhuma formiga. Nenhuma. Dou para meu amigo inspecionar. Ele me devolve o mesmo resultado. Zero.

As pessoas começam a ir embora. Fomos falar com o Dudão. Ele faz a mesma cara que todo mundo. "Como assim?", ele exclama. Não faz sentido algum.

Volto pra casa segurando meu fone em uma sacolinha rosa. Sou obrigado a escrever esse texto durante a longa viagem de metrô até minha residência. Está quente. Estou muito, muito suado. Estou coçando. Não por terem formigas em mim, mas por não terem formigas em mim.

Sinto que fui amaldiçoado. O karma negativo finalmente bateu. Foi culpa daquele último jogo. O deck rodou bem demais pra ser verdade.